Bibliotáfio #01

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Bibliotáfio, uma explicação

Sempre gostei de ler. Faz tempo que este universo da leitura se integrou ao meu modo de estar no mundo. Quando comecei este blog tinha a clara intenção de ir aos poucos adicionando colunadas referentes a outras áreas, deixando seu mote principal bem claro, a fotografia, mas expandindo horizontes possíveis. Esta é a primeira coluna que adiciono ao blog, um espaço para pensar sobre livros e leitura.

Quanto ao título cabe ainda dizer uma ou duas palavras, mais do que uma intenção crítica a coluna tem motivações afetivas fortes, falar de livros relevantes para mim, expor uma parte da minha estante. O foco principal – explícito no tipo de banner que introduz a coluna – certamente serão os livros infantis, pelos quais sou completamente apaixonada, este porém, não será o único gênero sobre o qual me debruçarei.

Livros infantis são bons para nos ajudar a pensar e repensar. São bons para fazer sonhar. Também por isso me encantam, nos mostram caminhos e descaminhos para o reencontro com a criança que todos somos.

Caminhos: achados e perdidos

Capa

Siga a Seta!

Autora: Isabel Minhós       Ilustrador: Andrés Sandoval

Editora: Companhia das Letrinhas

 Ano: 2012                Formato: 21.3 cm x 27.1  cm                           Páginas: 32

Conheci primeiro a editora, Planeta Tangerina, através de uma amiga. Depois conheci Isabel Minhós, uma das fundadoras da editora. Em uma caminhada por Lisboa no ano passado eu cheguei a Livraria Pó dos Livros, não foi um acaso, tinha toda a intenção de encontra-la. Há anos eu acompanhava o blog da livraria e conhecer o espaço fazia parte de um desejo antigo. Um fato sobre mim: o primeiro lugar que eu visito nas livrarias são os espaços destinados aos pequenos. Foi então que eu me encontrei, ao acaso, Siga a seta de Isabel Minhós e Andres Sandoval. Li ali mesmo onde estava, em pé, escorada em uma estante repleta de outras leituras saborosas. No Brasil a obra foi editada pela Companhia das Letras, em 2012.

O livro conta a história de uma cidade repleta de setas. Estas placas ditam o ritmo de toda a vida do lugar. Trata-se da cidade das setas, na qual ninguém nunca se perde, sempre existe uma seta que indica o caminho para onde se deve seguir. Até que um dia um rapazinho que vivia na cidade começa a se inquietar com uma questão importante: “O que será que existe no espaço entre as setas?” Este jovem vive sua vida na mesma rotina que os outros moradores da cidade, seguindo flechas que indicam o caminho e os afazeres da vida de todos. Seu pensamento é portanto, revolucionário, requer uma quebra de paradigma e requer uma faísca de curiosidade.

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As ilustrações de Andrés Sandoval constroem a cidade das setas através de uma mistura de formas geométricas e cores fortes. Alguns desenhos enchem a página de tal maneira que pensamos estar diante de uma enorme confusão, mas as setas estão sempre visíveis para indicar o caminho para os moradores da cidade das setas.  Sandoval usou técnicas mistas para trazer vida a história de Minhós. Guache e lápis dermatográfico deram conta dos desenhos, as setas por as vez foram desenhadas por ele, vetorizadas e transformadas em carimbos para a ilustração do livro. Andrés é brasileiro e uma de suas principais inspirações para criar a cidade das setas foi justamente a cidade de São Paulo, onde nasceu, o que também explica em parte essa paisagem repleta de elementos visuais, muito parecida com o tipo de vista com que se depara através da janela de sua casa em São Paulo.

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O rapaz então aventura-se no espaço entre as setas – curiosidade uma vez instalada raramente deixa quieta a mente de seu hospedeiro.  E começa a encontrar novidades, espaços inexplorados, realidades insólitas – como um urso polar tocando piano. Descobre até que existem moradores nos espaços entre setas quando se descuida e cai na toca de uma velha raposa. Aqui há uma leve mudança nos tons das ilustrações, Andrés Sandoval insere outras cores e traços que dão conta da beleza e da surpresa dos caminhos inexplorados.

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E o que acontece se mudarmos as setas de lugar em uma cidade onde todos seguem as setas? Bem, esta é a segunda ideia revolucionária do rapazinho cujos passos temos perseguido desde o início do livro. E não pretendo estragar a surpresa.

Isabel Minhós disse que “a ideia para o Siga a Seta surgiu num daqueles dias, entre 2.ª e 6.ª feira, em que temos os minutos contados para tudo e corremos para todo lado… Nesses dias, está tudo tão programado que há pouquíssimo espaço para o imprevisto e para o devaneio, e a sensação que tenho é a de que quase nem somos pessoas. Mais parecemos robôs a cumprir um horário e uma série de tarefas predestinadas. E a sensação não é muito boa. Sobretudo quando esta rotina claustrofóbica se repete dias após dia, acho que corremos grande perigo. Deixamos de viver com os olhos abertos, deixamos de procurar coisas novas, não deixamos que a surpresa entre nas nossas vidas, deixamos de ter tempo para olhar e ouvir os outros e também para deixar fluir os pensamentos. Tudo isso mata a imaginação e, acho eu, uma série de outras coisas importantes: a liberdade, o sentido crítico, a capacidade de pensarmos pela nossa cabeça”.

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Em outras palavras o livro é um convite para deixarmos de lado uma rotina sufocante que nos rouba a beleza da experiência de estar no mundo. Trata-se de pensar e refletir sobre que setas seguir e quais ignorar. Trata-se também de tornar-se capaz de rejeitar indicações que não nos levam a lugar nenhum, de criticar os caminhos que o mundo toma e de maneira livre ‘pensar pela nossa cabeça’, usando as palavras da autora portuguesa. Portanto, o livro abre espaço para refletirmos sobre quando seguir e quando não seguir setas. Não se trata é claro de tornar-se um rebelde a toa, mas de pensar a razão das coisas, e de por vezes espiar através daquele espacinho entre setas, pode ser que encontremos um por do sol que ninguém viu ainda.

Para saber mais:

Entrevista com Isabel Minhós

Siga a Seta: o trabalho de um ilustrador

Proposta didática da planeta tangerina

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